Tarefas emancipatórias que a Dimensão Social da Fé
Cristã exige de nós
A
Campanha da Fraternidade de 2015 – Fraternidade e sociedade – quer fortalecer a
Dimensão Social da Fé Cristã, que, com os movimentos espiritualistas,
volatilizadores e desencarnadores da fé cristã, anda meio atrofiada em muitos
ambientes religiosos. Vamos elencar na reflexão, abaixo, uma série de tarefas
que julgamos decorrer da Dimensão Social da Fé Cristã.
Promover libertação integral
Uma
das tarefas das pessoas cristãs é lutar pela libertação integral das pessoas e
de tudo e não apenas por libertação espiritual. No programa de Jesus, em Lc
4,16-21, consta uma libertação política (“libertar os presos”), social e
econômica (“anunciar uma boa notícia aos pobres”), libertação ideológica
(“restituir a visão”, e espiritual (“proclamar o Ano de Graça do Senhor”).
Assim, Jesus resgata o Jubileu Bíblico (Lev 25,8-12). No ano do Jubileu,
toca-se o “berrante” (em hebraico “sofar”),
que acontece no primeiro ano após sete vezes sete anos. Neste Jubileu, todas as
dívidas devem ser perdoadas; todas as terras devem voltar ao primeiro dono (aos
ancestrais); todos os escravos devem ser libertados. Enfim, é tempo de se fazer
uma reorganização geral na sociedade; tempo para recriar as relações humanas
com fraternidade, justiça, solidariedade libertadora, reconciliação e novos
sonhos.
Acreditar na ortopráxis
Outra
tarefa é defender uma ortopráxis (= testemunho libertador), não uma ortodoxia
(= opinião certa). O que de fato faz diferença não é tanto o que a gente pensa
ou em que acreditamos, mas o que fazemos (ou deixamos de fazer). É hora de
compromisso com o modelo de Igreja querido pelo papa Francisco: Igreja popular,
justa e misericordiosa. Urge compromisso com outro projeto de sociedade, que
seja justo, ecumênico e sustentável ecologicamente.
Rever conceitos
Verdade
não é adequação de um conceito a um objeto. Isso é verdade formal. “Verdade é o
que liberta todos e tudo”, diz o quarto evangelho da Bíblia. A verdade deve ser
buscada conjuntamente. Ninguém é dono da verdade. Verdade como o que liberta
deve ser buscada a partir dos pobres (últimos, pequenos,
discriminados): pobre, excluído, sem terra, indígenas, negros, pessoas com
deficiências, idosos, desempregados, homossexuais, mãe terra, irmã água,
favelados, vítimas da violência etc.
É
hora de perceber que a coisa mais sagrada é também profana. Profanar é retirar
do uso exclusivo para dar acesso a todos. Pro-fanar vem do verbo grego faneo, que quer dizer “brilhar”. Ou
seja, que o brilho do sagrado seja estendido a todos sem distinção e sem
nenhuma discriminação. É hora de gritar “Não a todo e qualquer dualismo!” Não
há separação entre espiritual e material, entre sagrado e profano, entre divino
e humano, entre santo e pecador, entre puro e impuro etc. Tudo está intimamente
relacionado.
Jesus
não morreu na cruz porque Deus quis, mas foi condenado à pena de morte pelos
podres poderes político-econômico e religioso.
Jesus
doou sua vida por todos e tudo. Jesus testemunha um caminho de salvação, porque
nos amou demais e não porque sofreu demais.
Jesus
tornou-se Cristo, pois conseguiu desenvolver o infinito potencial de humanidade
que cada pessoa traz consigo ao chegar a este mundo. “Jesus foi tão humano, tão
humano, que só podia ser Deus”, disse o papa Paulo VI.
Milagre
não é algo fruto de um poder extraordinário que está acima do humano. Milagre é
uma maravilha de Deus, conforme diz o Primeiro Testamento da Bíblia. Milagre é
um gesto solidário e libertador de Deus agindo nas entranhas da história.
Deus
não é juiz, pois Deus é amor. O único poder que Deus tem é o poder do amor, que
é de fato o que constrói.
Deus
não é transcendente, mas transdescendente. Na Bíblia, de ponta a ponta, vemos a
imagem de um Deus apaixonado pelo humano.
Deus
não é neutro diante dos conflitos. Deus faz opção preferencial pelos pobres
(cf. Ex 3,7-10).
Não
existe inferno, nem purgatório e nem limbo como locais destinados aos
pecadores, como descrito de forma tradicionalista por muitos nas igrejas.
Satanás (satã, em hebraico) ou diabo (diabolos,
em grego) não são entes abstratos, um deus negativo que faz oposição ao Deus da
vida. Satanás (diabo) é tudo o que divide, separa, desune, oprime, exclui,
discrimina e depreda. Pode ser uma dimensão interior nossa, mas em uma
sociedade capitalista neoliberal como a nossa, trata-se prioritariamente de
estruturas e instituições que oprimem, excluem e depreda a natureza. Podemos
dizer que o agronegócio é satânico, pois concentra riqueza em poucas mãos,
expulsa os pequenos do campo e devasta a biodiversidade. Uma democracia
burguesa formal que não respeita a Constituição Brasileira e pisa na dignidade
das pessoas é uma falsa democracia, algo também satânico.
Ser
cristão implica ser anticapitalista. Não dá para compactuar com os pretensos
valores do capitalismo: concorrência, competição, acumulação, lucrar e lucrar.
Ser cristão é ser outro Cristo, alguém que consola os aflitos, mas que também
incomoda os acomodados. Tarefa da pessoa cristã é buscar vida e liberdade para
todos e tudo – e não apenas para alguns - mas a partir dos últimos.
Por Frei Gilvander Moreira
Continuaremos com a reflexão na próxima postagem
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