Não esqueçamos: Javé, o Deus solidário e libertador, optou pelos pobres, ao ouvir o clamor dos oprimidos e descer para libertá-los (Cf. Ex 3,7-10) das garras do imperialismo dos faraós do Egito. As profetisas e os profetas da Bíblia fizeram opção pelos injustiçados ao denunciar as injustiças dos fazendeiros, do sistema monárquico, o ritualismo de muitos sacerdotes, ao desmascarar os falsos profetas, aqueles defensores da Teologia da Prosperidade. Optaram pelos empobrecidos ao consolar os aflitos (cf. Is 43,1-5) e ao incomodar os chefes da nação, como o profeta Miquéias que profetizou: “Ouvi, peço-vos, chefes e príncipes, vós que odiais o bem, e amais o mal, que arrancais a pele de cima dos pobres, e a carne de cima dos seus ossos. E que comeis a carne do meu povo, e lhes arrancais a pele, e lhes esmiuçais os ossos, e os repartis como para a panela e como carne dentro do caldeirão (Miq 3,1-3).”
Jesus de Nazaré optou pelos empobrecidos indo da solidariedade à luta pela justiça, o que lhe custou condenação à morte pelos podres poderes da época. Jesus anunciou e testemunhou um projeto de libertação integral. Em seu programa consta libertação política (libertação dos presos), social e econômica (evangelizar os pobres), restituição da visão (libertação ideológica), e “espiritual” (proclamação do Ano de Graça do Senhor). Isso em Lc 4,16-21, onde Jesus resgata o Jubileu Bíblico, que cultiva a utopia de reviver a experiência de fraternidade das origens camponesas, do tempo do deserto; recomeçar tudo de novo a partir dos oprimidos; refazer a História a partir dos injustiçados; resgatar as identidades que humanizam; conquistar justiça para os injustiçados a partir deles; redistribuir as terras dando-lhes função social; perdoar as dívidas interna e E(x)terna; redistribuir riquezas e rendas; restituir os direitos roubados, voltar a conviver de modo fraterno com a nossa mãe Terra, que é nossa única casa.
As primeiras comunidades cristãs se organizaram a partir das casas (Oikia, em grego), comunidades locais, onde buscavam vivenciar um projeto coletivo para o bem comum de todos (At 2,42-47). Ao invés de acumular, partilhavam tudo o que tinham, o que sabiam, seus problemas e buscas comunitárias. Ao longo da História dos cristianismos “144 mil” foram martirizados, porque ousaram ser luz que incomoda o mundo de trevas dos sistemas que moem vidas, foram sal na terra incomodando a comida e se fizeram fermento que causa coceira na massa (cf. Mt 5,13-16).
Sob inspiração do Concílio Vaticano II e das Conferências dos bispos da América Afrolatíndia (1ª no Rio de Janeiro, 1950; 2ª em Medellín/Colômbia, 1968; 3ª em Puebla/México, 1979; 4ª em Santo Domingos/República Dominicana, 1992; e a 5ª em Aparecida/Brasil, 2005), a Igreja Povo de Deus, reunida nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e nas Pastorais Sociais, com o respaldo e inspiração da Teologia da Libertação, milhares de pessoas cristãs doaram suas vidas na luta por reforma agrária, reforma urbana, em defesa dos Direitos Humanos e demonstraram compromisso com a construção de uma sociedade justa e solidária. Uma multidão de mártires ao longo de 514 anos de história de opressão no Brasil. Citamos alguns: Frei Caneca, Padre Henrique, Padre Ezequiel Ramin, Padre Josimo Tavares, Chico Mendes, Santo Dias, Margarida Alves, padre Gabriel, Irmã Dorothy Stang, Dom Oscar Romero, Eloy Ferreira, cristãos que se engajaram em sindicatos dos trabalhadores, no MST, na CPT, no CIMI, em muitos movimentos sociais populares e inúmeras pessoas anônimas que ao se posicionar contra as violências foram eliminadas fisicamente. Foram mortas, assim como o Galileu de Nazaré, mas estão ressuscitadas na luta.O exemplo de luta nos anima a seguir lutando coletivamente sendo luz, sal e fermento na sociedade.
Continua a reflexão na próxima postagem .
Por Frei Gilvander Luiz Moreira
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